Boa
tarde a todos que nos acompanham. Seguem os comentários necessários
para fins de parâmetro na elaboração da peça prático
profissional de direito penal. Boa sorte a todos!
Peça:
A peça a ser utilizada é a Apelação, com fundamento no artigo
593, inciso I, do CPP, a saber:
Art.
593. “Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias:
I
– das sentenças definitivas de condenação (…).”
No
caso, foi proferida sentença penal condenando Eliete à pena final
de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão. Ao final, converteu a
pena privativa de liberdade em restritiva de direitos,
consubstanciada na prestação de 8 (oito) horas semanais de serviços
comunitários, durante o período de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses
em instituição a ser definida pelo juízo de execuções penais.
Endereçamento
da Petição de Interposição: Excelentíssimo Senhor Doutor
Juiz de Direito da __ Vara Criminal da Comarca de ______ .
Endereçamento
das Razões do Recurso de Apelação:
Egrégio
Tribunal de Justiça
Colenda
Câmara
Teses:
1)
Reformatio in pejus: De acordo com o enunciado do problema, a
primeira sentença penal que julgou procedente a pretensão
acusatória foi na data de 10 de dezembro de 2009, momento em que
condenou Eliete à pena final de 2 (dois) anos de reclusão, como
incurso nas penas do artigo 155, §4º, inciso II, do CP. Entretanto,
após a interposição de recurso de apelação exclusivo da defesa,
o Tribunal de Justiça anulou a instrução criminal por ter ocorrido
cerceamento de defesa. Após a realização do trâmite de nova
instrução criminal, foi proferida a segunda sentença penal em 9 de
fevereiro de 2011 que condenou Eliete à pena final de 2 (dois) anos
e 6 (seis) meses de reclusão.
Nas
razões do recurso de apelação deve ser mencionada que a segunda
sentença violou o princípio da proibição da reformatio in pejus,
de acordo com o artigo 617, do CPP, a saber, a reformatio in pejus
indireta. Com o trânsito em julgado para a acusação, a pena não
pode ultrapassar dois anos de reclusão de acordo com a primeira
sentença proferida.
O
artigo 617 do CPP esclarece:
Art.
617 “O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao
disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não
podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver
apelado da sentença”.
Para
que não seja restringido o direito à ampla defesa, que abrange o
direito aos recursos previstos na lei, não é possível que a
situação do recorrente seja prejudicada em recurso exclusivo da
defesa.
Se
a decisão for anulada em recurso exclusivo da defesa, a nova decisão
não pode prejudicar o acusado, sob pena de afronta a tal princípio.
O
princípio da ne reformatio in pejus indireta significa que o
julgador não pode agravar a situação do recorrente em nova
sentença proferida em virtude da anulação da anterior em recurso
exclusivo da defesa.
Em
razão do art. 617 do CPP já referido, a situação do acusado não
pode ser agravada ou piorada no julgamento de recurso exclusivo da
defesa. Quando o recurso exclusivo da defesa ensejar a anulação da
sentença, o juiz ficará limitado nos termos da decisão anterior
para proferir nova decisão em virtude da reformatio in pejus
indireta. Assim, a segunda sentença proferida em 09 de fevereiro de
2011 que condenou Eliete a pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de
reclusão não deve prevalecer.
Pedido
correspondente: Requer seja reconhecida a reformatio in pejus,
com a aplicação da pena em no máximo 2 (dois) anos.
2)
Prescrição: Outro ponto a ser destacado é que houve a prescrição
da pretensão punitiva, em razão do trânsito em julgado para a
acusação. Levando-se em consideração a primeira sentença que
impôs pena de dois anos de reclusão, pois, apesar de ter sido
anulada toda a instrução criminal e ter sido proferida nova
sentença penal, com majoração na pena (2 anos e 6 meses de
reclusão) a primeira deve prevalecer sob pena de afronta ao
princípio da reformatio in pejus indireta.
A
prescrição significa a perda do poder estatal de punir o acusado
por praticar determinada infração penal. No caso, levando-se em
consideração a primeira pena imposta em sentença, ou seja, dois
anos, ocorreu a prescrição da pretensão punitiva, de acordo com o
artigo 109, inciso V, do CP, pois, entre o termo inicial (artigo 117,
inc. I, do CP), ou seja, o recebimento da denuncia em 12/01/2007 e a
prolação da sentença válida em 09/02/2011, de forma a ultrapassar
lapso maior que 4 (quatro) anos, tempo necessário para consumar-se a
prescrição. Interessante lembrar que para fins de contagem de prazo
penal deve incluir o dia do começo, de acordo com o artigo 10 do CP.
Pedido
correspondente: Requer seja reconhecida a prescrição nos moldes
dos arts. 107, inc. IV, bem como, art. 109, inc. V, com a consequente
extinção da punibilidade do agente.
3)
Não incidência da qualificadora. Com relação ao enquadramento
legal referente ao furto qualificado por abuso de confiança (art.
155, §4º, inciso II), esta qualificadora não deve incidir no caso.
Isso porque, a relação de confiança pressupõe que haja um vínculo
especial. De acordo com Gustavo Octaviano Diniz Junqueira “o fato
de ser empregado não denota necessariamente confiança, que é um
especial vínculo subjetivo que se impõe gradativamente. O empregado
com uma semana de serviço não goza de especial confiança por parte
do empregador”.
Em
razão de Eliete ter sido contratada por Cláudio, suposta vítima,
há apenas uma semana e que a mesma só tinha obrigação de
trabalhar às segundas, quartas e sextas-feiras, e, ainda, pelo fato
de ter ficado comprovado que o suposto fato criminoso teria ocorrido
no terceiro dia de trabalho da doméstica, inexiste relação de
confiança para que possa incidir a qualificadora. Como não há a
possibilidade de configurar-se a figura típica do furto qualificado,
que, ao menos, houvesse sido incurso nas penas do crime de furto
simples (caput, do art. 155, do CP).
Pedido
correspondente: Requer seja reconhecida a não incidência da
qualificadora do abuso de confiança, com a consequente
desclassificação para furto simples.
4)
Atipicidade material e princípio da insignificância/bagatela. Outra
argumentação é com relação a reforma da sentença para que a
acusada seja absolvida por atipicidade material de sua conduta.
Para
o Supremo Tribunal Federal a tipicidade penal é o conjunto da
tipicidade formal (princípio da legalidade, configurado na subsunção
do fato à norma) mais a denominada tipicidade material
(potencialidade de lesão ao bem jurídico alheio). Assim, pode-se
argumentar que as lesões insignificantes ao bem jurídico não
produzem tipicidade material, sendo o fato considerado como atípico.
O
princípio da insignificância é gênero do qual é espécie, o
princípio da bagatela (que abrangem alguns crimes da esfera
patrimonial, tais como o furto).
No
caso, a atipicidade material da conduta e, consequentemente, o
princípio da insignificância ou da bagatela, justificam a limitação
da lesividade material da conduta. O furto no valor de R$ 50,00, não
pode ser considerado conduta típica do ponto de vista material,
pois, a vítima, o patrão da denunciada, era o presidente da maior
empresa do Brasil no segmento de venda de alimentos no varejo. Além
do mais, foi juntado aos autos a comprovação do rendimento de
Cláudio, suposta vítima, que girava em torno de R$50.000,00
(cinquenta mil reais) mensais. De acordo com o princípio da
insignificância os fatos que não são capazes de causarem lesões
ao bem jurídico tutelado e consequentemente, a ofensa for irrisória
e ínfima, não devem ser considerados relevantes sob o aspecto
penal. Apesar de incidir formalmente no tipo penal, no caso, furto, a
conduta de Eliete deve ser considerada atípica materialmente, pelo
fator de desproporção entre a quantia supostamente furtada e a
condição social e rendimentos mensais comprovados da vítima.
Pedido
correspondente: Em razão da aplicação do princípio da
bagatela, requer seja o fato reconhecido como atípico. Se o fato é
atípico, não há crime, consequentemente não pode haver punição
e, sim a absolvição da acusada.
5)
Furto privilegiado. Outra argumentação possível caso, não seja
reformada a sentença para a absolvição da acusada é, em caráter
eventual, a incidência da figura típica denominada furto
privilegiado, nos termos do §2º, do artigo 155, do CP, cuja pena
seria a aplicação de multa. Assim, é direito subjetivo do agente
e, não mera faculdade do juiz, o enquadramento legal, desde que
presentes os requisitos da primariedade e ser de pequeno valor a
coisa furtada.
Pedido
correspondente: seja reconhecido o furto privilegiado e
consequentemente, a aplicação da pena de multa.
6)
Bis in idem. Configurou-se o denominado bis in idem, dupla
punição pelo mesmo fato, pois o aumento da pena base se deu em
virtude da justificativa pelo juiz do abuso de confiança. Isso
porque, o enquadramento do tipo penal acerca da incidência do
suposto abuso de confiança já foi levado em consideração no
momento de tipificar o delito de furto qualificado. O juiz não pode
se pautar com a mesma justificativa para enquadrar o delito, bem
como, para aumentar a pena base, sob pena de configurar-se o bis
in idem.
Pedido
correspondente: Requer seja reduzida a pena através do
reconhecimento do bis in idem.
7)
Caso sejam preenchidos os requisitos do art. 77, do CP, em razão da
desconsideração do delito de furto qualificado por abuso de
confiança e, que ao menos, seja reconhecido a tipificação de furto
na modalidade simples, que incida a suspensão condicional da pena
(sursis). Ainda, há a possibilidade de argumentar-se sobre a
suspensão condicional do processo (art. 89, da L. 9.099/95) , quando
a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano (que é o
caso, quando considerado o furto simples). Além do mais, é
incompatível a pena restritiva de direitos aplicada. Isso porque, o
§3º do art. 46 define que as tarefas devem ser cumpridas à razão
de uma hora de tarefa por dia de condenação. Em contrapartida, o
juiz definiu a prestação de 8 (oito) horas semanais de serviços
comunitários, durante o período de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses.
----------
Conforme
divulgado pelo gabarito da FGV, alternativamente, poderão ser
opostos embargos de declaração.
Peça:
Embargos de Declaração, com fundamento no art. 382, do CPP.
Endereçamento:
Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da __ Vara Criminal da
Comarca de ______ . (ao juiz que proferiu a sentença recorrida).
(espaço
de 5 linhas)
Eliete,
já qualificada nos autos de apelação nº ___, representada por seu
advogado que esta subscreve, vem, respeitosamente, perante Vossa
Excelência, tempestivamente, opor EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, com
fundamento no artigo 382 do Código de Processo Penal, pelas razões
de fato e de direito a seguir expostas.
I
– DOS FATOS
II
– DO DIREITO
Trata-se
de decisão obscura com relação ao artigo de lei que fundamentou a
condenação, tendo em vista que houve perfeita narrativa de furto
cometido com abuso de confiança, mas a capitulação dada não
existe.
Houve
obscuridade, ou seja, falta de clareza, quanto a correspondência do
que foi declarado em sentença penal condenatória e o artigo de lei
em que a capitulação legal do delito foi inserido.
Na
realidade, a fundamentação teve previsão no artigo 155, §2º,
inciso IV, do CP, embasando o furto qualificado, mediante o abuso de
confiança entre a empregada e o patrão.
Ocorre
que, a capitulação legal para a tipificação de tal delito não
existe. O correto seria inserir a figura típica que justificou a
condenação, descrita como furto qualificado por abuso de confiança,
no artigo 155, §4º, inciso II, do CP,e não no artigo 155, §2º,
inciso IV,conforme assegura a sentença penal que julgou procedente a
pretensão acusatória, a fim de que haja a perfeita subsunção dos
fatos à norma, ou seja, para que ocorra a exata tipificação formal
do delito em questão.
Ainda,
ocorreu evidente obscuridade com relação aos critérios adotados
pelo juiz, uma vez que baseou-se tão somente na gravidade do crime
por abuso de confiança, para reconhecer o aumento da pena. O
magistrado não foi claro o suficiente para justificar a sua decisão
no sentido de ter considerado a conduta da acusada como grave.
Incorre a justificativa do aumento da pena base no bis in idem, uma
vez que o fator do abuso de confiança, não pode também ser
justificado para respaudar a tipificação da conduta (furto
qualificado), bem como, servir como base para majorar a pena base,
que foi distanciada do mínimo.
Com
relação a substituição da pena privativa de liberdade em
restritiva de direitos, pode-se afirmar que a decisão é no mínimo,
contraditória. Isso porque, ficou definida que tal penalidade
deveria ser cumprida mediante a prestação de 8 (oito) horas
semanais de serviços comunitários, durante o período de 2 (dois)
anos e 6 (seis) meses. Entretanto, assegura o artigo 46, §3º, do
CP, que as tarefas devem ser cumpridas à razão de uma hora por dia
de condenação, de modo que a fixação imposta pelo magistrado
extrapolou o limite assegurado pela lei.
Portanto,
a referida decisão com pontos obscuros, bem como, contraditórios,
deverá ser corrigida pela medida ora requerida.
III
– DO PEDIDO
Diante
do exposto, requer sejam recebidos e providos os presentes embargos,
de forma a corrigir a referida contradição e obscuridade,
aplicando-se a redução da pena imposta a Embargante, como medida de
justiça.
Nesses
termos,
pede
deferimento.
Local,
18 de fevereiro de 2011.
Advogado
________ OAB nº________
----------
Reflexão:
“Nunca desista de seus objetivos pois, pior que a vergonha da
derrota é a vergonha de não ter lutado”.
Até
mais. Fiquem com Deus.
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