Boa tarde a todos que nos acompanham.
Segue mais uma questão de direito penal do último certame do Exame
de Ordem (1ª fase), referente ao caderno verde.
60) Acerca da aplicação da lei penal
no tempo e no espaço, assinale a alternativa correta:
a) As leis penais temporárias e
excepcionais são dotadas de ultra-atividade. Por tal motivo, são
aplicáveis a qualquer delito, desde que seus resultados tenham
ocorrido durante sua vigência.
b) O ordenamento jurídico-penal
brasileiro prevê a combinação de leis sucessivas sempre que a
fusão puder beneficiar o réu.
c) Se um funcionário público a
serviço do Brasil na Itália praticar, naquele país, crime de
corrupção passiva (art. 317 do Código Penal), ficará sujeito à
lei penal brasileira em face do princípio da extraterritorialidade.
d) Na ocorrência de sucessão de
leis penais no tempo, não será possível a aplicação da lei penal
intermediária mesmo se ela configurar a mais favorável.
Alternativa A: errada.
Primeiramente, cumpre esclarecer que o tema “aplicação da lei
penal no tempo” rege-se pela aplicação da lei vigente à época
dos fatos (tempus regit actum)”, ou seja, aplica-se ao crime
a lei que estiver vigorando na época de seu cometimento. A exceção
ocorre diante da hipótese de aplicar uma lei a fatos corridos fora
do âmbito de sua vigência, tais como o fenômeno da
ultra-atividade.
Ocorre a ultra-atividade da lei quando
mesmo após cessar a sua vigência, a lei mantém a sua eficácia,
quando for mais benéfica que outra lei, ou seja, aplica-se a lei
penal benéfica já revogada, a fato ocorrido após o período de sua
vigência.
O artigo 3º do Código Penal
esclarece:
Art. 3º “A lei excepcional ou
temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas
as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado
durante a sua vigência”.
Outro ponto relevante é saber os
conceitos de lei penal temporária e excepcional. São denominadas
leis de vigência temporária pois, diferente das outras normas, a
sua vigência não é indeterminada, na espera que lei posterior as
revogue. Estão inseridas em seu bojo o momento de sua
auto-revogação.
Mais especificamente, lei penal
temporária é aquela que tem a data preordenada de expiração do
termo de sua vigência, ou seja, tem determinado no bojo de seu texto
o tempo que irá vigorar, como por exemplo, “20 de agosto do
corrente ano”.
Com relação as leis excepcionais,
são as que não mencionam expressamente o prazo de sua vigência,
porém a condicionam à duração de determinadas circunstâncias
excepcionais, tais como, epidemia, guerra, período de seca etc. A
lei excepcional, chamada também de lei temporária em sentido amplo,
significa que o prazo de sua vigência não é prefixado, pois,
destina-se a atender situações de necessidades transitórias.
As leis de vigência temporária são
consideradas, sempre, ultra-ativas, uma vez que seus efeitos
permanecem ainda que findo o prazo de sua vigência. Justifica-se
desse modo, pois, se assim não fosse os indivíduos aguardariam o
final da vigência dessas leis, a fim de se beneficiarem com a
impunidade e exigirem a aplicação da lei nova, que desconsideraria
determinado fato como infração penal.
Conclui-se que tanto a lei temporária
como a lei excepcional são consideradas ultra-ativas, uma vez que
seus resultados não precisam necessariamente ter ocorrido durante
sua vigência e assim, seus preceitos continuam valendo mesmo após
cessada sua vigência. Isso para evitar sua ineficácia.
Alternativa B: errada. O
critério da sucessividade diz que havendo um período de tempo que
separa duas ou mais leis aplicáveis ao mesmo fato, resolve-se o
aparente conflito, através da preferência a lei posterior (lex
posterior derogat priori), por ser mais recente. Dessa forma, o
ordenamento jurídico não prevê a possibilidade de fusão de leis
sucessivas quando puder beneficiar o réu.
Se fosse o caso de lei posterior
integralmente favorável ao réu, em respeito ao princípio da
retroatividade da “lex mitior” (art. 2º, P.U., CP), a lei deve
retroagir, inclusive sendo também preceito constitucional (art. 5º,
inc. XL, da CF/88). Nesse caso, seria possível que a lei posterior
fosse aplicada a fatos anteriores à sua vigência quando favorecesse
o acusado, considerada como retroativa.
Contudo, a assertiva traz à tona a
hipótese de conjugar leis sucessivas, quando a fusão dessas normas
beneficiar em tese, o acusado. Exemplo: se o acusado que praticou o
crime na vigência da antiga lei de drogas, poderia ficar sujeito as
penas dessa lei (3 a 15 anos), de acordo com o antigo art. 12 da Lei
6.368/76, já revogado, combinando-se com o benefício trazido pela
nova Lei 11.343/2006, art. 33 §4º, relativamente a causa de
diminuição de pena (causa de redução de pena de 1/6 a 2/3, para o
réu primário, sem antecedentes criminais e sem envolvimento com
organizações criminosas). É nesse aspecto que a assertiva faz o
questionamento, se poderia fusionar tais leis sucessivas para o
benefício do réu.
No caso, a questão afirma que o
ordenamento jurídico-penal, admite expressamente a possibilidade de
combinar leis sucessivas, o que não é verdade. Pode-se até
argumentar no sentido de que se isso ocorresse, o juiz estaria
extrapolando sua função jurisdicional e adentrando na esfera
legislativa, o que em tese, afrontaria o princípio da separação
dos poderes na fusão dessas normas, incorrendo numa terceira lei,
inexistente (lex tertia).
Alternativa C: correta.
Com relação ao tema “aplicação da lei penal no espaço”, A
regra é vigorar o princípio da territorialidade, de acordo com o
artigo 5º do Código Penal, que diz que a lei brasileira é aplicada
aos delitos cometidos no território nacional, levando-se em
consideração o conceito de soberania. Contudo, admite-se
excepcionalmente a aplicação do princípio da
extraterritorialidade, previsto no artigo 7º do Código Penal, que
permite aplicar-se a lei penal brasileira a delitos ocorridos fora do
país, no estrangeiro.
No caso, aplica-se a hipótese do
artigo 7º, inciso I, alínea “c”, do CP, a seguir enunciado:
Art. 7º Ficam sujeitos à lei
brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
I – os crimes:
[…]
c) contra a administração pública,
por quem está a seu serviço;
De acordo com a assertiva, o
funcionário público a serviço do Brasil, na Itália pratica o
crime de corrupção passiva e, por isso, de acordo com o princípio
da extraterritorialidade, fica sujeito à lei penal brasileira.
Consagra-se no caso, o princípio real, da defesa ou da proteção.
Trata-se de extraterritorialidade
considerada incondicionada, pois de acordo com o §1º do artigo 7º
do CP, o agente é punido de acordo com a lei brasileira, ainda que
absolvido ou condenado no estrangeiro.
Alternativa D: errada.
Ocorrendo a sucessão de leis penais no tempo, é possível aplicar a
lei penal intermediária se ela configurar a mais favorável.
Primeiramente, necessário esclarecer
o que é uma lei penal intermediária, sendo que é aquela que surge
depois da data do fato porém, foi revogada antes da sentença.
Assim, é possível ocorrer os dois efeitos, ou seja, a aplicação
dos efeitos da retroatividade, bem como, da ultra-atividade. Trata-se
de uma lei que vigorou e perdeu seu efeito sem ter regido
especificamente determinado fato, embora sendo a mais benéfica ao
acusado, e por isso, deve ser aplicada.
Conforme acrescenta Guilherme de Souza
Nucci:
“Para a escolha da lei penal mais
favorável devemos ter em vista como marco inicial, a data do
cometimento da infração penal, e, como marco final, a extinção da
punibilidade pelo cumprimento da pena ou outra causa qualquer. De
todo modo, entre o fato e a extinção da punibilidade, portanto,
durante a investigação policial, processo ou execução da pena,
toda e qualquer lei penal favorável, desde que possível a sua
aplicação, deve ser utilizada em prol do réu”.
Dessa forma, ocorrendo a sucessão de
leis penais no tempo, é possível aplicar a lei penal intermediária
se ela configurar a mais favorável ao acusado.
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