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(2) Direito Penal: Resolução do V Exame Unificado - 2011.2 - da OAB

Written By Priscila Ázer Mazoti on quinta-feira, 10 de novembro de 2011 | 19:50

Boa noite a todos.
Segue resolução da questão de nº 59 do caderno verde do Exame de Ordem 2011.2. Há controvérsia a respeito de anular-se o gabarito preliminar divulgado, devido as explicações abaixo expostas. Porém, o posicionamento da banca acerca da adoção de uma corrente doutrinária (ainda que seja essa minoritária), muitas vezes não é motivo suficiente para a anulação. Mas, vale a pena tentar de acordo com os seguintes argumentos transcritos.

59) Apolo foi ameaçado de morte por Hades, conhecido matador de aluguel. Tendo tido ciência, por fontes seguras, que Hades o mataria naquela noite e, com o intuito de defender-se, Apolo saiu de casa com uma faca no bolso de seu casaco. Naquela noite, ao encontrar Hades em uma rua vazia e escura e, vendo que este colocava a mão no bolso, Apolo precipita-se e, objetivando impedir o ataque que imaginava iminente, esfaqueia Hades, provocando-lhe as lesões corporais que desejava. Todavia, após o ocorrido, o próprio Hades contou a Apolo que não ia matá-lo, pois havia desistido de seu intento e, naquela noite, foi ao seu encontro justamente para dar-lhe a notícia. Nesse sentido, é correto afirmar que:
(A) mesmo sendo o erro escusável, Apolo não é isento de pena.
(B) havia dolo na conduta de Apolo.
(C)mesmo sendo o erro inescusável, Apolo responde a título de dolo.
(D) Apolo não agiu em legítima defesa putativa.

Alternativa A: incorreta. Quando o erro é considerado “escusável” (desculpável), também denominado como inevitável, invencível ou insuperável, pode-se concluir que o agente torna-se isento de pena. Justifica-se de acordo com a primeira parte do §1º, do artigo 20, do CP.

Art. 20, §1º, CP. É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.

Alternativa B: correta. No caso, a banca examinadora, com relação ao instituto do erro, utilizou como posicionamento doutrinário a denominada “teoria extremada da culpabilidade” (normativa pura), para justificar o gabarito preliminar da questão.
O estudo do erro quanto às descriminantes putativas, do Código Penal, versa sobre causas que, ocorridas em virtude do imaginário do agente, se existissem, excluiriam a antijuridicidade de sua ação típica. A descriminante putativa também pode ser chamada de erro sobre pressuposto fático de causa excludente de antijuridicidade, descriminante putativa por erro de tipo, ou ainda, erro de tipo permissivo (se adotada a teoria limitada da culpabilidade).
Existem dois posicionamentos doutrinários acerca da teoria da culpabilidade, porém a doutrina se divide com relação a natureza jurídica das descriminantes putativas.
Com relação ao erro quanto aos pressupostos fáticos das excludentes, parte da doutrina defende a teoria limitada da culpabilidade, que considera o caso um típico erro de tipo permissivo, permitindo a exclusão do dolo. No entanto, há quem considere a teoria extremada da culpabilidade como correta, pois argumentam ser o caso de um erro de proibição, logo, sem excluir-se o dolo.
De acordo com a teoria extremada da culpabilidade, todo erro sobre a presença de uma descriminante, quer pela equivocada apreciação dos fatos, ou pela errada concepção sobre a existência de uma causa de justificação, é considerado como erro de proibição.
Trata-se de erro de proibição, excluindo-se apenas a culpabilidade. Nesse caso, o agente imagina que sua conduta seja lícita, porém, age com dolo. Apesar de agir com dolo, sua conduta não é reprovável por não ter consciência da ilicitude de sua conduta. Nesse sentido, posiciona-se Julio Fabbrini Mirabete.
Outra teoria, é a denominada “teoria limitada da culpabilidade”, adotada pelo legislador na exposição de motivos da Nova Parte Geral do CP, a qual também aderem Francisco de Assis Toledo, Fernando Capez e Damásio Evangelista de Jesus.
A teoria limitada da culpabilidade, diz que as descriminantes putativas constituem-se em erro de tipo permissivo e excluem o dolo. Aquele que supõe, justificadamente, pelas circunstâncias do fato, que pratica um fato típico, em legítima defesa, por exemplo não tem sua conduta considerada como dolosa.
Cumpre ressaltar, que da exposição de motivos da Lei 7.219, de 11/7/1984, consta expressamente a adoção da denominada teoria limitada da culpabilidade. E por isso, essa é a corrente seguida pela legislação pátria. Destaca-se o teor do item nº 17 da exposição de motivos da Nova Parte Geral do Código Penal:

17. (…) Definiu-se a evitabilidade do erro em função da consciência potencial da ilicitude (parágrafo único do artigo 21), mantendo-se no tocante às descriminantes putativas a tradição brasileira, que admite a forma culposa, em sintonia com a denominada “teoria limitada da culpabilidade” (“culpabilidade e a problemática do erro jurídico penal”, de Francisco de Assis Toledo, in RT, 517:251).

Interessante notar, os comentários de Guilherme de Souza Nucci, a esse respeito (Manual de direito penal, editora: revista dos tribunais, 2005, pág. 336):

Cremos que, na visão atual do Código Penal, deu-se ao erro quanto aos pressupostos fáticos que compõem a excludente de ilicitude um tratamento de erro de tipo, embora seja, na essência, um erro de proibição. Inserida a hipótese no §1º do art. 20 (erro de tipo), bem como, delineando-se, claramente, que, havendo erro derivado de culpa, pune-se o agente por delito culposo, é fatal concluir que se cuidou dessa situação tal como se faz no caput do artigo com o erro de tipo (…). Fica excluído o dolo, mas pode ser punido pelo que causar, de maneira inescusável, a título de culpa”.

O gabarito da questão pode ser revisto, se considerada a teoria limitada da culpabilidade, adotada pelo legislador e doutrina preponderante, pois nesse caso não seria correto afirmar que havia dolo na conduta de Apolo.
A teoria limitada da culpabilidade significa que de acordo com o erro de tipo permissivo, é possível excluir o dolo do comportamento do agente. Com relação ao erro escusável (inevitável), tanto o dolo como a culpa ficariam excluídos. Já, se estiver diante de erro inescusável (evitável), exclui-se o dolo, mas, a punição à título de culpa é permitida.
Portanto, de acordo com a chamada teoria limitada da culpabilidade, o erro sobre tipo permissivo tem como consequência, sempre excluir o dolo. Se inevitável, exclui também a punição por crime culposo. Se evitável, permite a punição por crime culposo, se houver previsão legal.

Alternativa C: incorreta. Se o erro é considerado inescusável, o dolo fica afastado, permitindo a punição por crime culposo, se houver a figura típica. Assim, embora o equívoco tenha ocorrido, o dolo está afastado, porém, pode remanescer a punição na esfera da culpa, se houver para o delito culposo o tipo penal correspondente. É o final do artigo 20, §1º, o qual preceitua “ (…) não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo”. No caso, as lesões corporais provocadas por Apolo em Hades, podem configurar o delito previsto no artigo 129, §6º, CP, ou seja, lesão corporal culposa, em virtude do erro ser considerado inescusável.

Alternativa D: incorreta, uma vez que Apolo agiu em legítima defesa putativa. Primeiramente, necessário se faz esclarecer o conceito de descriminante putativa. Descriminante é excludente de ilicitude e, putativa significa imaginária, ou seja, alguém supostamente imagina que está diante de alguma das excludentes de ilicitude. No caso, o agente (Apolo) imaginou estar agindo amparado pela legítima defesa, de acordo com o artigo 25 do CP:

Art. 25, CP. “Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.

De acordo com o problema, Apolo foi ameaçado de morte por Hades, (conhecido matador de aluguel). Tal ameaça é considerada como injusta agressão, e, ainda, teve informações seguras de que a ameaça de morte se concretizaria naquela noite. Com o intuito de repelir a putativa “injusta agressão”, reagiu esfaqueando Hades e provocando-lhe lesões corporais. Apolo, então, agiu precipitadamente no intuito de defesa iminente e, por isso, configurou-se o denominado instituto da legítima defesa putativa.
É possível também considerar que houve o denominado erro quanto aos pressupostos fáticos de uma causa de exclusão de ilicitude.
O agente (Apolo) se equivocou ao achar que estava em uma situação de defesa, pois, soube por fontes seguras que Hades o mataria naquela noite. Assim, ao encontrá-lo em uma rua vazia e escura, e vendo-o colocar a mão no bolso, imaginou que ocorreria um ataque, na verdade inexistente. Ora, se a excludente de ilicitude (legítima defesa) compõe-se de requisitos, dentre eles a injusta agressão, o erro de Apolo recaiu justamente sobre esse elemento. Achou que se encontrava diante de um ataque injusto, em realidade inexistente. Se fosse real a agressão, configurar-se-ia a legítima defesa, como não houve qualquer injusta agressão, configurou-se a legítima defesa putativa.

Reflexão: Lembrem-se: O estudo, dedicação e esforço pessoal são requisitos indispensáveis para a vitória e sucesso. Por isso, assim dizia Aristóteles: “a grandeza não consiste em receber honras, mas em merecê-las”. Deus os ilumine!
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